Por Luiza Rampelotti
A fotografia mais recente do bem-estar da população brasileira escancara as distâncias que ainda se impõem entre oferta de serviços básicos e garantia de direitos. Embora o Paraná tenha alcançado uma média de 60,83 pontos no Índice de Progresso Social (IPS) 2025 – acima da média nacional, que ficou em 58,70 –, todos os sete municípios do Litoral continuam abaixo desse patamar. A avaliação anual, baseada em 57 indicadores sociais, ambientais e econômicos, foi divulgada no final de maio e aponta avanços importantes em áreas como saúde e educação básica, mas revela, ao mesmo tempo, que os territórios litorâneos ainda enfrentam dificuldades estruturais profundas, sobretudo na dimensão das oportunidades.
O IPS é calculado a partir de três grandes eixos: Necessidades Humanas Básicas, Fundamentos do Bem-Estar e Oportunidades. A pontuação vai de 0 a 100. O índice é uma ferramenta internacional, sem fins lucrativos, criada pela Social Progress Imperative e adaptada no Brasil pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), em parceria com organizações como a Fundação Avina e a iniciativa Amazônia 2030. A base de dados utilizada é exclusivamente pública e inclui registros de instituições como o IBGE, o Ministério da Saúde (DataSUS), o Ministério da Educação e o Ministério do Desenvolvimento Social.
A Ilha do Mel FM analisou os dados do Litoral, que mostram que nenhum município atinge o mínimo de 65 pontos necessário para ser classificado como de “progresso social elevado”. Morretes (59,36) e Pontal do Paraná (59,24) são os que mais se aproximam, com desempenho destacado em saúde, segurança e educação básica.
Na outra ponta, Paranaguá registra o pior índice da região, com 55,70 pontos. O desempenho chama atenção por contrastar com a posição estratégica do município, que concentra a maior infraestrutura portuária do Paraná e é o segundo maior porto graneleiro da América Latina, sendo responsável por parte expressiva das exportações brasileiras. Além disso, a cidade é sede administrativa de grande parte dos serviços públicos do Litoral, o que acentua ainda mais a disparidade entre sua relevância econômica e os indicadores sociais.
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Os dados reforçam que, apesar dos esforços na ampliação de serviços básicos, os municípios do Litoral ainda falham no enfrentamento das desigualdades sociais e da exclusão. A dimensão “Oportunidades” – que mede o grau de liberdade individual, igualdade de direitos e acesso à educação superior – foi a mais mal avaliada em todos os sete municípios. Em Guaratuba, por exemplo, a nota ficou em apenas 33,82, a mais baixa da região. Nenhuma das cidades superou a marca de 41 pontos nesse indicador.
Morretes lidera o ranking regional, mas ainda sofre com exclusão
Com o melhor desempenho do Litoral, Morretes alcançou 59,36 pontos no índice geral. O município teve seu maior destaque na dimensão das Necessidades Humanas Básicas, com 74,65 pontos. O resultado se explica pelo bom desempenho em segurança pública, acesso a água potável, saneamento básico e habitação. Também apresenta bons números em saúde e educação, com 63,89 pontos em Fundamentos do Bem-Estar.
O principal gargalo, no entanto, continua sendo a inclusão: com 39,55 em Oportunidades, o município ainda enfrenta entraves relacionados à equidade de gênero, participação política e mobilidade social de populações historicamente marginalizadas.
Pontal do Paraná se destaca em saúde e educação, mas falha em equidade
Logo atrás de Morretes, Pontal do Paraná soma 59,24 pontos no índice geral. Foi o melhor colocado regionalmente na dimensão Fundamentos do Bem-Estar, com 65,94 pontos. Esse desempenho está relacionado à ampla cobertura da educação básica e à presença de serviços de atenção primária em saúde. O município também apresenta indicadores positivos em segurança e infraestrutura.
No entanto, ao olhar para Oportunidades, o cenário se repete: com 39,17 pontos, o município expõe a ausência de políticas voltadas ao ensino técnico, à juventude, à diversidade e à redução de desigualdades.
Antonina apresenta equilíbrio, mas resultados ainda tímidos
Com 57,78 pontos no IPS geral, Antonina aparece com notas medianas nas três dimensões. São 71,77 pontos em Necessidades Humanas Básicas, 61,48 em Fundamentos do Bem-Estar e 40,09 em Oportunidades. O município não possui nenhum grande destaque positivo ou negativo, mas também não demonstra avanços expressivos.
A ligeira vantagem em relação aos demais municípios na dimensão das oportunidades pode estar relacionada a uma base populacional menor e à presença de políticas sociais pontuais, embora ainda insuficientes para provocar transformação estrutural.
Matinhos repete o padrão regional: bons serviços, baixa inclusão
Com nota geral de 57,77, Matinhos tem uma realidade parecida com a de Antonina. O município apresenta 70,96 pontos em Necessidades Humanas Básicas e 63,51 em Fundamentos do Bem-Estar, indicadores que apontam boa cobertura em saúde, educação e segurança.
A nota em Oportunidades, porém, estaciona em 38,85. O município ainda carece de políticas de inclusão que garantam acesso à formação profissional, proteção social a populações vulneráveis e estímulo à participação cidadã.
Guaratuba contrasta bons serviços básicos com péssima inclusão
Com 57,57 pontos no índice geral, Guaratuba alcança a segunda melhor nota em Necessidades Humanas Básicas, com 73,89. O município também foi bem avaliado em Fundamentos do Bem-Estar, com 65,01 pontos.
O que chama a atenção, no entanto, é o seu desempenho em Oportunidades: apenas 33,82. É a nota mais baixa entre todos os municípios do litoral paranaense nessa dimensão. O dado revela uma cidade com bons indicadores de urbanização e serviços públicos, mas onde o acesso a direitos fundamentais ainda é extremamente desigual.
Guaraqueçaba enfrenta limitações históricas e estruturais
Guaraqueçaba obteve 56,11 pontos no IPS geral. O município, com grande extensão territorial e baixa densidade populacional, sofre com acesso precário a serviços públicos e infraestrutura. A nota em Necessidades Humanas Básicas é de 68,19, enquanto os Fundamentos do Bem-Estar somam 61,44.
A dimensão de Oportunidades, por sua vez, ficou em 38,69. Os resultados apontam para a necessidade de políticas públicas que enfrentem as especificidades territoriais e promovam conectividade, acesso à educação superior e investimentos em mobilidade.
Paranaguá tem o pior desempenho geral da região
Apesar de ser o principal centro urbano do Litoral do Paraná, Paranaguá teve a pior avaliação regional, com 55,70 pontos. A cidade alcançou 64,56 em Necessidades Humanas Básicas, 62,88 em Fundamentos do Bem-Estar e 39,65 em Oportunidades.
A posição no ranking expõe uma contradição: mesmo com estrutura administrativa sólida e importância econômica nacional, o município apresenta desigualdades internas profundas. A qualidade de vida nas áreas periféricas, comunidades tradicionais e regiões insulares continua comprometida, sobretudo por falta de saneamento, moradia digna e segurança.
Desafios e caminhos possíveis
A análise dos dados do IPS 2025 revela que os municípios do Litoral avançaram na oferta de serviços básicos, mas ainda enfrentam obstáculos estruturais para garantir acesso equitativo a oportunidades. As políticas públicas implementadas nos últimos anos contribuíram para ampliar o atendimento em saúde e educação, mas foram insuficientes para enfrentar as desigualdades que atravessam o território.
A dimensão das oportunidades – a mais crítica em todos os municípios – reforça a necessidade de ações afirmativas, políticas de juventude, incentivo à educação técnica e superior, além da valorização da diversidade social, étnica e cultural. Mais do que números, o IPS oferece um retrato detalhado das condições de vida da população e serve como ferramenta estratégica para a formulação de políticas públicas mais justas, inclusivas e duradouras.








