Por Luiza Rampelotti
Uma polêmica envolvendo o vereador e pastor Irineu Cruz (União Brasil) motivou a apresentação de um projeto de resolução na Câmara Municipal de Paranaguá que pretende, pela primeira vez, regulamentar de forma detalhada as hipóteses de faltas e licenças de vereadores, bem como os critérios e documentos necessários para a devida justificativa.
O caso veio à tona após a revelação de que o parlamentar havia se ausentado de quatro sessões ordinárias do Legislativo, realizadas nos dias 10, 11, 17 e 18 de março. Na ocasião, ele participava de uma missão na Ilha de Marajó, no Pará, e não houve desconto de qualquer valor de seu subsídio mensal, fixado em R$ 16.500,00, além de R$ 2.576,00 de vale-alimentação.
A ausência do vereador foi abonada administrativamente após a apresentação de uma declaração da Missão Cristã Mundial, organização com a qual ele tem vínculos há mais de duas décadas. No documento, a entidade informa que a finalidade da viagem foi a coleta de dados sobre a realidade das populações insulanas em situação de vulnerabilidade social, especialmente crianças e adolescentes vítimas de violência. De acordo com a Câmara, a justificativa foi aceita com base em uma prática recorrente há décadas, ainda que sem respaldo explícito no regimento interno.
Câmara admite lacuna normativa
Em nota oficial, o presidente da Casa de Leis, vereador Adalberto Marcos de Araújo (Republicanos), reconheceu que não há regulamentação específica sobre os critérios para abono de faltas parlamentares. “Durante décadas, o Departamento competente da Câmara sempre efetuou pagamentos integrais a vereadores que apresentassem declarações ou documentos que indicassem o cumprimento de agendas de interesse público“, disse.
Para sanar essa lacuna normativa e evitar novas controvérsias, a presidência elaborou o Projeto de Resolução nº 0528/2025. A proposta revoga o §5º do artigo 79 do Regimento Interno e acrescenta o artigo 79-A ao Capítulo II do Título III, além de alterar o artigo 108. O texto define de forma detalhada as hipóteses de justificativa de faltas e os documentos exigidos para sua comprovação.

O texto, protocolado na última quarta-feira (23), passa a definir com precisão o que será considerado falta e quais situações poderão ser justificadas – com base em documentação comprobatória e prazos específicos. De acordo com a proposta, será atribuída falta ao vereador que deixar de comparecer às sessões plenárias, salvo nos casos em que a justificativa seja previamente aceita. Para ser considerada presente, a vereadora ou vereador deverá registrar presença, participar das votações e permanecer no plenário até o encerramento dos trabalhos legislativos.
O artigo 79-A, §2º, enumera as hipóteses que serão aceitas como justificativas:
- Motivo de saúde, própria ou de familiar dependente;
- Falecimento de parente até segundo grau, com até 8 dias consecutivos de abono;
- Casamento, com até 8 dias consecutivos;
- Licença-paternidade e maternidade, nos prazos definidos por lei (15 dias e 180 dias, respectivamente);
- Adoção ou guarda judicial, por igual prazo à licença maternidade;
- Missão oficial da Câmara;
- Atividades parlamentares externas autorizadas pelo plenário.
Cada tipo de justificativa requer um documento específico, como atestado médico, certidão de óbito ou declaração oficial, que deverá ser entregue em até três dias úteis após sua expedição. No caso das atividades externas, o vereador deverá apresentar requerimento para aprovação prévia do plenário.
A proposta prevê ainda a publicação mensal da frequência dos parlamentares no portal oficial da Câmara e o desconto de 1/30 do subsídio por sessão não justificada, conforme o §7º. O projeto deverá ser votado nas próximas sessões e, se aprovado, terá aplicação imediata, promovendo maior rigor e transparência na condução das atividades legislativas.
Posicionamento do vereador Irineu Cruz
Durante entrevista exclusiva concedida à Ilha do Mel FM, na última terça-feira (22), Irineu Cruz reiterou que não viajou com objetivo religioso e que ele próprio procurou a missão para integrar o grupo que realizaria uma pesquisa de campo sobre a violência contra crianças no Marajó. “Eu fui pesquisar. Eu fui levantar dados. Aonde eu vou, Jesus está comigo, mas não fui para pregar. Não visitei igrejas. Não foi essa a motivação“, afirmou.
O parlamentar afirmou ainda que tomou a iniciativa de comunicar o setor de Recursos Humanos da Câmara para que fossem verificados os procedimentos para devolução proporcional dos valores referentes às sessões em que esteve ausente. “Eu não preciso do dinheiro da Câmara. Eu vivo do que Deus me dá. Se for necessário, eu devolvo, sem problema algum. Isso encerra a polêmica. Não estou aqui para me enriquecer“, declarou.
Irineu também destacou que sua atuação resultou em dados e propostas que podem contribuir com políticas públicas voltadas às comunidades ilhadas de Paranaguá, como regularização fundiária, fortalecimento das marisqueiras locais e combate à evasão escolar. Ele afirmou ter protocolado requerimentos e articula a realização de uma audiência pública com representantes nacionais do enfrentamento à exploração infantil.
Questionado sobre a repercussão negativa do caso, Irineu Cruz afirmou compreender as críticas, mas também se disse alvo de um contra-ataque político. “Injustiçado é a palavra, mas compreender a crítica também compreendo. Politicamente, esses caras iam me atacar. Fui eu quem delatei, fui eu quem apontou erros. Então, é um contra-ataque. Tenho uma família, filhos, esposa. Eles choraram. Mas fui eleito para isso, para brigar pela cidade de Paranaguá. Eu sigo fazendo meu trabalho, com transparência e temor a Deus”, concluiu.









