Por Luiza Rampelotti
Nesta quarta-feira, 19 de março, é celebrado o Dia do Artesão, uma data que homenageia aqueles que, por meio do talento e do trabalho manual, preservam tradições, expressam a cultura local e transformam matérias-primas em arte. Em Paranaguá, o Mercado do Artesanato abriga atualmente 10 artesãos, cada um com técnicas e histórias próprias, mas todos compartilhando um desafio em comum: a dificuldade de obter reconhecimento e valorização.
Apesar da riqueza cultural e do potencial econômico do artesanato, os profissionais relatam que ainda enfrentam obstáculos para garantir visibilidade, especialmente junto ao público local. A Ilha do Mel FM conversou com alguns deles, que contaram sobre suas trajetórias, as dificuldades enfrentadas e a importância do turismo para manter vivo esse ofício.
A arte que nasce da paixão e da persistência
Sonia Elaine Celestino sempre teve afinidade com o artesanato. Seu caminho começou com a pintura em panos de prato, mas foi em 2011 que decidiu expandir suas habilidades e se aventurar no universo das telas e da madeira.
“Eu sempre gostei de pintar, mas queria algo maior. Meu marido recorta as madeiras recicladas e eu as pinto. Fazemos porta-chaves, porta-retratos, porta-tempero e diversas outras peças. Tudo feito manualmente, com muito carinho“, conta Sonia.

Embora ame o que faz, ela lamenta a falta de valorização do artesanato por parte da população local. “O artesão não é valorizado. Muitas pessoas passam em frente ao mercado e nem entram para conhecer nosso trabalho. Claro, há exceções, mas, em geral, quem mais valoriza são os turistas, que vêm de fora e querem levar um pedacinho da cidade como lembrança“, desabafa.
Para ela, a realização de eventos e a presença do turismo são fundamentais para impulsionar as vendas e dar visibilidade ao trabalho artesanal. A temporada de cruzeiros, por exemplo, fazia grande diferença no faturamento.
“Nos dias em que os navios estavam na cidade, vendíamos o equivalente a 300% do que faturamos no ano inteiro. Agora, sem essa movimentação, a situação fica mais difícil“, afirma.
Mesmo diante dos desafios, Sonia ressalta a importância da profissão e pede que a data seja lembrada.
“O Dia do Artesão precisa ser valorizado. Trabalhamos com as mãos, transformamos materiais que seriam descartados em arte. Paranaguá tem uma cultura riquíssima, que pode ser representada por uma peça de madeira, uma tela, um objeto feito com fibra natural, crochê… Somos um povo de artesãos, e isso precisa ser reconhecido”, disse.
Couro de peixe: um trabalho minucioso que carrega tradição
Serli Salvador se dedica ao trabalho com couro de peixe há dez anos. A técnica, pouco conhecida, envolve um longo e detalhado processo de produção.
“São quatro dias de trabalho intenso para transformar a pele do peixe em couro utilizável. Não é um processo simples, mas é fascinante“, explica.
Ela faz parte de uma associação de Pontal do Paraná e trabalha ao lado de outras nove mulheres, sob a coordenação de profissionais da UNESPAR, em um projeto de extensão. Juntas, elas transformam o couro em bolsas, leques, chapéus e outros acessórios.
“Cada uma de nós se especializou em um tipo de produto, mas eu gosto mesmo de fazer bolsas. O couro de peixe se tornou meu carro-chefe“, conta Serli, orgulhosa.

Embora venda bem durante a temporada de cruzeiros e em eventos, ela acredita que a falta de divulgação do mercado dificulta a valorização do trabalho dos artesãos. “Muitas pessoas que visitam o espaço dizem que nem sabiam que ele existia. Precisamos de mais divulgação, de iniciativas que ajudem a aproximar o público local da gente“, comenta.
Para ampliar suas oportunidades de venda, Serli participa de feiras em diversas cidades do Paraná, como Curitiba, Londrina e Guarapuava.
“Não é fácil, dá trabalho, mas é muito gratificante ver que nosso artesanato chega a diferentes partes do estado“, diz.
A arte no vidro e no arame: uma habilidade rara
Luís Carlos dos Santos, por sua vez, encontrou seu dom no vidro e no arame. Desde 1994, ele transforma lâmpadas fluorescentes e metais em peças artísticas.
“Foi através de um sonho que eu recebi o dom do vidro. Desde então, me dedico a essa arte. Não é qualquer um que consegue amolecer vidro e moldá-lo“, conta ele.
Seu trabalho já foi tema de reportagens em canais de televisão, justamente por ser algo raro e minucioso. Mas, apesar do reconhecimento da mídia, ele sente a mesma dificuldade relatada pelos colegas: a queda no turismo afetou diretamente suas vendas.

“Os turistas compram e valorizam nosso trabalho. Mas, com a diminuição do turismo em Paranaguá, passamos por dificuldades. O movimento caiu muito, e isso impacta diretamente nosso sustento“, lamenta.
Para ele, o que falta é incentivo e uma mudança na mentalidade da população.
“As pessoas precisam valorizar mais o nosso trabalho. Aqui no mercado tem peças lindas, com preços acessíveis, feitas com amor e dedicação. Muita gente busca presentes diferentes e não percebe que pode encontrar algo único e exclusivo aqui mesmo, diretamente com o fabricante“, concluiu.
A importância da valorização do artesanato local
Os relatos de Sonia, Serli e Luís Carlos revelam um cenário comum entre os artesãos de Paranaguá: a paixão pelo que fazem é inegável, mas a falta de valorização e de incentivos dificulta a permanência na profissão.
No Dia do Artesão, eles reforçam um pedido: que a população local e as autoridades olhem com mais atenção para o setor. “Paranaguá é uma cidade rica em cultura e tradição. O artesanato é parte essencial da nossa identidade. Se não for valorizado, pode se perder“, alerta Sonia.
O Mercado do Artesanato, localizado no Centro Histórico da cidade, é um espaço que reúne talento, história e criatividade. Para que essa tradição continue viva, é fundamental que mais pessoas conheçam, prestigiem e apoiem os artesãos locais. Seja adquirindo uma peça, divulgando o trabalho ou simplesmente visitando o mercado, cada gesto conta para fortalecer essa arte que resiste ao tempo.