Por Luiza Rampelotti
A segurança pública sempre foi um ambiente dominado por homens, mas isso está mudando. Cada vez mais mulheres têm ocupado posições na linha de frente da segurança, protegendo as cidades e enfrentando desafios diários para garantir direitos, combater crimes e salvar vidas. No entanto, para chegarem até aqui, muitas delas precisaram enfrentar preconceitos, resistências e, muitas vezes, provar muito mais do que o necessário.
Neste Dia Internacional da Mulher (8), a Ilha do Mel FM conheceu histórias de algumas dessas profissionais que atuam na segurança pública em Paranaguá. São mulheres que não apenas desempenham suas funções com excelência, mas que também quebram barreiras, inspiram outras e fortalecem a representatividade feminina em cargos historicamente masculinos.
Márcia Garcia: da chefia da Guarda Municipal à Patrulha Maria da Penha
Desde 1999 na Guarda Civil Municipal, Márcia Garcia percorreu um longo caminho na segurança pública. Trabalhou no trânsito, na Defesa Civil e, durante quase três anos, foi comandante geral da Guarda Civil Municipal – um cargo de grande responsabilidade e desafios ainda maiores para uma mulher.
“Eu estou na Guarda Civil Municipal desde a primeira turma, em 1999. O caminho foi longo, passei por várias áreas, como trânsito e Defesa Civil, mas a maior dificuldade foi quando assumi como comandante geral da Guarda Civil. Você sendo mulher, tem que provar muito mais. Tem que mostrar que tem capacidade, que sabe como liderar uma equipe, que pode tomar decisões. Eu sabia que estava preparada, mas percebi que, para muitos, eu ainda precisava me provar”, relata.

Após esse período, encontrou seu verdadeiro propósito na Patrulha Maria da Penha, onde atua há seis anos. “Aqui é onde me encontrei. O trabalho com mulheres vítimas de violência vai além de simplesmente garantir o cumprimento da medida protetiva. Muitas delas chegam completamente desorientadas, sem saber como agir, sem ter para onde ir. Nosso papel não é apenas executar a lei, mas acolher, orientar e ajudar essa mulher a reconstruir sua vida. O mais importante é que elas saibam que não precisam de julgamento, precisam de apoio”, conta.
Márcia também fala sobre a importância de ter uma equipe composta exclusivamente por mulheres. “Muitas vítimas se constrangiam ao serem atendidas por homens. A presença feminina faz a diferença. Criamos um vínculo de confiança, elas se sentem mais seguras para relatar suas histórias. E é isso que queremos: garantir que elas tenham coragem para recomeçar”.
A sua mensagem para outras mulheres é de esperança. “Nada é imutável. A vida pode mudar a qualquer momento, basta a gente querer e buscar. Só não há solução para a morte, mas, enquanto estamos vivas, podemos transformar nossas histórias”, conclui.
Flávia Belgrowicz Martins: bombeira militar e condutora de caminhão
A soldado Flávia Belgrowicz Martins cresceu cercada por militares e encontrou na profissão a sua vocação. “A minha inspiração vem da minha própria família. Cresci nesse ambiente e sempre admirei a profissão. Então, quando decidi ser militar, nada parecia me impedir. Nem mesmo o fato de ser mulher. Minha família sempre me incentivou e me impulsionou, então eu nunca enxerguei o meu gênero como um obstáculo”, diz.
No entanto, ela reconhece que as mulheres na corporação ainda precisam provar constantemente sua capacidade. “Os desafios são reais. A gente está sempre sendo testada, sempre precisando provar que é tão capaz quanto os homens. Mesmo depois de tanto tempo na profissão, ainda há olhares desconfiados, ainda há barreiras a serem quebradas. Mas estamos conquistando espaço”.

Uma de suas maiores conquistas foi a habilitação para dirigir caminhão. “Quando tirei minha habilitação, percebi o quanto isso ainda era incomum. Muitas pessoas se surpreendem quando me veem dirigindo um caminhão, e escutamos comentários como ‘tinha que ser mulher’ no trânsito. Mas cada vez que uma mulher assume o volante de um veículo como esse, estamos normalizando a nossa presença nesses espaços”, comenta.
Para ela, o momento mais gratificante é quando vê crianças se inspirando no seu trabalho. “É emocionante quando uma menina olha para mim e diz: ‘Eu não sabia que mulher podia ser bombeira!’. E eu respondo: ‘Pode sim, pode ser o que quiser’. Eu acredito nisso. Sei que ainda precisamos provar muita coisa, mas, se for necessário provar, a gente prova”, finaliza.
Maluhá Soares: uma delegada que inspira outras mulheres
A delegada Maluhá Soares descobriu sua vocação nos últimos anos da faculdade de Direito. Foi então que começou a se preparar para os concursos públicos e, após anos de estudos, alcançou o seu objetivo.
“Sempre gostei da área policial, sempre me interessei pelo assunto, lia sobre isso, acompanhava. Durante os últimos anos da faculdade, percebi que queria seguir essa carreira. Então, comecei a estudar para concursos, foram anos de preparação, até conseguir minha aprovação”, conta.

Hoje, atuando na Polícia Civil, percebe como o ambiente ainda é majoritariamente masculino. “A grande maioria dos policiais são homens. Dentro da delegacia, ainda somos minoria, e isso reflete a estrutura da segurança pública. Mas quando falamos de violência doméstica, de violência de gênero, a presença feminina faz muita diferença. É por isso que nas delegacias especializadas a prioridade é ter delegadas mulheres. Muitas vítimas chegam fragilizadas, com medo. Quando elas veem que quem está ali para ajudá-las é outra mulher, elas se sentem mais seguras”.
Para Maluhá, a representatividade é essencial para incentivar outras mulheres. “Acredito que quanto mais mulheres ocuparem esses cargos, mais inspiramos outras a buscarem sua independência, seja ela financeira, emocional ou psicológica. Precisamos de mais mulheres em posições de liderança, para que possamos mostrar umas às outras que somos capazes”, destaca.
Paula Ribeiro: 17 anos na Polícia Militar e a luta pelo respeito nas ruas
Cabo da Polícia Militar do Paraná, no 9º Batalhão, Paula Ribeiro ingressou na corporação em 2008. Desde o início, enfrentou desafios, especialmente na fase de treinamento. “O teste físico foi um dos maiores desafios. É algo bem puxado para nós mulheres, mas também é algo que nos motiva. Entramos sabendo que será difícil, mas encaramos o desafio porque queremos estar aqui”, diz.
Além do treinamento, a rotina policial também exigiu dela uma adaptação entre a vida profissional e pessoal. “Quando entrei na corporação, já tinha dois filhos. Então, para mim, o desafio foi duplo: conciliar o trabalho com a maternidade, enfrentar a jornada de uma policial e, ao mesmo tempo, ser mãe. Não foi fácil, mas foi possível”.

Nas ruas, enfrentou outra barreira: o respeito à figura da mulher policial. “Infelizmente, nem sempre a população respeita uma policial feminina da mesma forma que respeita um policial homem. Ainda há resistência, ainda há olhares que questionam a nossa autoridade. Mas a gente continua, a gente enfrenta, e a gente está aqui para mostrar que tem a mesma capacidade”.
Ela reforça que cada mulher que entra na segurança pública abre caminho para outras. “Cada dia que passamos na ativa, estamos quebrando tabus e conquistando espaço. A aceitação ainda precisa melhorar, mas estamos no caminho”, conclui.
Segurança pública: um espaço também das mulheres
Ser mulher na segurança pública é muito mais do que exercer uma profissão. É um ato de coragem, resistência e transformação. Cada uma dessas profissionais, além de proteger Paranaguá, também abre caminhos para que outras mulheres possam ocupar esse espaço no futuro.
O crescimento da participação feminina na segurança pública é um reflexo da luta por igualdade e representatividade. Cada mulher que veste a farda, que assume um posto de comando ou que conduz uma viatura contribui para uma sociedade mais justa e segura – não apenas na proteção dos cidadãos, mas também na garantia de que o futuro da segurança passa, cada vez mais, pelas mãos delas.