Cerca de 2.700 toneladas de farelo de soja, avaliadas em aproximadamente R$ 6 milhões, foram barradas durante fiscalização no Porto de Paranaguá. A carga, originada em Alto Araguaia, Mato Grosso, foi destinada ao terminal portuário para exportação, mas foi reprovada na inspeção por suspeita de contaminação com areia. Com isso, cerca de 60 caminhões permanecem estacionados no pátio, enquanto os motoristas aguardam uma solução por parte da empresa responsável.
A reprovação ocorreu na quarta-feira (22), após auditoria do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR) identificar irregularidades durante o processo padrão de inspeção. Seguindo as diretrizes do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), as cargas foram classificadas como fora do padrão de qualidade exigido para exportação, sendo destinadas ao descarte no aterro sanitário de Paranaguá.
Entretanto, a empresa responsável pelo farelo, Queiroz Agro, contesta a decisão e nega que o produto esteja adulterado. Em nota, a empresa afirmou que as cargas atendem aos padrões de exportação estabelecidos pelo regulamento técnico Anec 71, que trata de contratos de farelo de soja ou pellets FOB no Brasil. Segundo o regulamento, a tolerância para areia e sílica varia entre 0,5% e 1,5%, dependendo das negociações contratuais.
Além disso, a Queiroz Agro destacou que todos os caminhões contratados possuem rastreadores, o que reforça o controle durante o transporte e, segundo a empresa, impossibilita a adulteração no trajeto. Até o momento, nenhuma alternativa para o descarte foi indicada, prolongando o impasse.
Prejuízo para os caminhoneiros
O bloqueio das cargas tem gerado prejuízos diretos aos caminhoneiros, que enfrentam a estadia prolongada no Pátio de Triagem do porto, sem previsão de liberação para seguir viagem. Para alguns motoristas, a espera já ultrapassa 11 dias, agravada pela falta de acordo entre transportadoras e clientes quanto ao pagamento das diárias.
“Fui chamado pelos caminhoneiros porque gerou o problema da estadia. Algumas transportadoras já acertaram os valores com o sindicato, mas ainda tem duas que não resolveram, alegando que o cliente não autorizou o pagamento. São cerca de 60 caminhões que permanecem no pátio porque é o lugar mais seguro, mas estão perdendo cargas e sofrendo prejuízos”, explicou Hilton Antônio Rangel, representante do Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens de Londrina e Região (Sindicam – LDA), em entrevista à Ilha do Mel FM.
Segundo ele, o descarte de farelo, que é o principal produto transportado, está atrasado, e o local destinado ao descarregamento está lotado. O sindicato estima que o processo de descarga ainda levará mais dois ou três dias para ser concluído. “Essas transportadoras que não acertaram dizem que aguardam a autorização do cliente, já que o repasse depende deles. Enquanto isso, os caminhões estão há 11 dias parados em Paranaguá, acumulando prejuízos por um problema que não é deles”, pontuou o representante sindical.
Os valores em negociação visam cobrir, ao menos, as despesas dos motoristas durante os dias de paralisação. O sindicato tem trabalhado para mediar os acordos e minimizar as perdas. “Estamos negociando para que os caminhoneiros consigam, no mínimo, cobrir as despesas desses dias parados. A média de valor das cargas é de cerca de R$ 100 mil, considerando 45 toneladas por caminhão”, detalhou Rangel.
Descarte no aterro sanitário
Rogério Francisco Gonçalves, sócio do aterro sanitário do Complexo Industrial Eco Tecnológico (CIETec), em Alexandra, informou que, até o momento, apenas 11 caminhões foram descarregados, de um total de 34 contratados para a operação. Ele reforçou que o volume de resíduos não impacta significativamente as atividades do aterro.
“Não há necessidade de nenhuma ação fora da nossa rotina. Apenas adaptamos a área de descarregamento de resíduos para receber esse tipo de caminhão, algo que já fizemos em outras ocasiões”, explicou Gonçalves em conversa com a Ilha do Mel FM.
Porto reforça fiscalização
A administração dos Portos do Paraná destacou que o sistema de controle e fiscalização de cargas, implementado em 2024, foi essencial para identificar a irregularidade. Segundo a autoridade portuária, todos os casos suspeitos são encaminhados às autoridades policiais e aos órgãos fiscalizadores, como o MAPA, mas a responsabilidade pelas mercadorias é do exportador e do terminal portuário.
A empresa pública também informou que as inspeções de qualidade são conduzidas pela Associação de Terminais de Exportação do Porto de Paranaguá (ATEXP), responsável por emitir os laudos técnicos das cargas. A Ilha do Mel FM procurou a ATEXP para comentar o caso, mas não obteve retorno até a conclusão desta reportagem.
Histórico da classificação de produtos no Porto de Paranaguá
A classificação de produtos como soja, milho e farelo de soja para exportação pelo Porto de Paranaguá ocorria até setembro de 2022 pela CODAPAR – Companhia de Desenvolvimento Agropecuário do Paraná, que incorporou a CLASPAR em 2011. Suas atividades foram posteriormente agrupadas na criação do IDR-PR.
Em 2022, a responsabilidade pela classificação no Pátio de Triagem foi transferida da Portos do Paraná – que administra os portos de Paranaguá e Antonina – para a ATEXP, que contratou a empresa internacional Bureau Véritas (BV) para executar o serviço. Desde janeiro de 2024, o IDR-Paraná audita esses procedimentos por meio da Auditoria da Classificação de Produtos por Tarefas.
“Após o registro da carga no sistema Carga On-Line (COL) do Porto de Paranaguá, a BV realiza amostragens e classificação dos produtos. O IDR-Paraná audita as tarefas, atuando com maior intensidade em casos de relevância, como a recente constatação de areia em farelo de soja”, explicou Wagner Spirandelli, gerente do IDR-Paraná.
Segundo Wagner, a desclassificação de um produto impede sua comercialização sem avaliação prévia do MAPA. Laudos da BV sobre produtos desclassificados são referendados por classificadores credenciados do IDR-Paraná.
“No caso da areia no farelo de soja, os lotes foram desclassificados e registrados como suspeita de fraude no sistema COL. A areia compromete a qualidade do farelo, danifica correias transportadoras e prejudica a reputação do Brasil no mercado internacional”, disse o gerente do IDR-Paraná.
Wagner ainda esclareceu que os classificadores do IDR-Paraná utilizam testes organolépticos (visão, tato e som) e testes rápidos com água para identificar a presença de areia. “A distinção entre areia adicionada propositalmente e terra natural da soja é feita por meio dessas análises”, concluiu.