Por Matheus Poli
No Litoral do Paraná, a cultura caiçara tem grande força e é muito conhecida, mas ainda passa por dificuldades na perpetuação do movimento nas novas gerações. Com isso, alunos da Universidade Estadual do Paraná (Unespar) campus Paranaguá, do curso de Letras/Português, em parceria com o mestre de Fandango Aorélio Domingues, criaram um projeto que busca dar notoriedade para a cultura popular da região e divulgar a cultura para além das divisas.
O dicionário tem como objetivo registrar de forma concreta as expressões linguísticas e os falares característicos da cultura caiçara, funcionando também como uma ferramenta pedagógica para ser utilizada nas escolas da região. Em formato digital, o material poderá ser acessado de qualquer lugar do mundo e contará com atualizações constantes, reunindo palavras e expressões presentes no cotidiano das comunidades litorâneas.
A professora Karina Fonsaca, Doutora em Literatura e Cultura, é a apoiadora, organizadora e responsável pela divulgação do projeto. A iniciativa surgiu a partir de uma proposta de extensão universitária, vinculada à disciplina de ensino da língua portuguesa. “A criação do dicionário é apenas uma parte de um conjunto mais amplo de ações. Ainda é um espaço pequeno diante de tudo o que o povo caiçara tem reivindicado e pelo qual vem lutando”, afirmou.
Assim como ocorre em todas as culturas, a visibilidade e a valorização das tradições são fundamentais para manter viva a identidade local. Nesse contexto, o dicionário surge como uma ferramenta de preservação do legado caiçara, reafirmando sua importância como patrimônio histórico do litoral paranaense.
“O dicionário é uma forma de dar visibilidade, de garantir a perpetuação e de fortalecer a resistência cultural. As culturas orais antecedem a urbanização de Paranaguá e precisam ser registradas. A memória e a oralidade só permanecem vivas quando continuam sendo transmitidas pelas comunidades”, explicou Karina.
Além de contribuir para a preservação da cultura, o dicionário também busca investigar a genealogia dos termos, acompanhar as transformações linguísticas provocadas pelo contato com outros territórios e documentar expressões típicas do cotidiano caiçara.
A defesa da cultura caiçara
A cultura caiçara é formada por uma miscigenação de povos originários, negros e europeus, que deu origem a um modo de vida diferente e com várias tradições como festas religiosas, artesanato, pesca artesanal entre outras. Para que a cultura continue viva e que se perpetue para as novas gerações, é necessário existir uma forma de divulgação e continuação do que já existe no Litoral do Paraná.
Para um dos mestres do Fandango de Paranaguá e criador do projeto, Aorélio Domingues, que também é presidente da Associação de Cultura Popular Mandicuera, o dicionário é uma forma de ampliação das ações para preservar a cultura caiçara. “O caiçara se define pelo seu modo de vida e pela relação direta com o território onde vive. Esse território tradicional se estende de Paraty, no Rio de Janeiro, até a Baía da Babitonga, em Santa Catarina. É fundamental compreendermos que a identidade caiçara está profundamente enraizada nesse espaço geográfico. Por isso, ao falarmos em preservar a cultura caiçara, estamos necessariamente falando em preservar o território onde ela se manifesta”, disse.
Para o mestre, o modo de vida caiçara e suas funções socioambientais só podem ser mantidos vivos se houver continuidade no território. “É um povo com mais de 500 anos de história, que desenvolveu expressões próprias e criou nomenclaturas específicas para nomear seu cotidiano, suas práticas e saberes. Preservar qualquer elemento que identifique essa cultura é, também, uma forma de fortalecer a luta pela permanência no território”, destacou.
Neste contexto, o dicionário é uma das frentes de atuação da Associação Mandicuera, que, com o apoio da universidade, de estudantes, professores e entusiastas da cultura local, tem conseguido ampliar ações voltadas à valorização e ao registro do modo de vida caiçara. “A Associação Mandicuera também faz um trabalho de educação e desenvolvimento da cultura caiçara com projetos voltados a educação, levando oficinas para as escolas por meio de parcerias com a Secretaria de Educação de Paranaguá, projetos através da Secretaria de Cultura e da Secretaria de Turismo que envolvem produção cultural e manifestações populares”, informou Aorélio.
A parceria dos alunos com o projeto
Com o desenvolvimento do projeto, alunos e professores puderam estar mais perto da cultura caiçara e desenvolver novos olhares para o desenvolvimento da classe. “Participar do projeto foi, no início, um desafio, pois eu não tinha conhecimento suficiente sobre o assunto. Apesar de ser novato, não conhecia boa parte da nossa cultura. A maior dificuldade que enfrentamos no começo foi a escolha do tema para o projeto. Felizmente, a professora Karina Fonseca assumiu as aulas e a coordenação do projeto, permitindo que ele fosse executado sem mais dificuldades. Graças ao empenho dela, conseguimos dar continuidade a essa iniciativa tão enriquecedora’’, comentou Gustavo Lourenço, acadêmico de Letras da Unespar.
O projeto agora ganha forma e logo poderá ser consultado por toda a população para que todos tenham um pouco da cultura caiçara em casa.