Por Luiza Rampelotti
Paranaguá registrou um aumento no número de casos de HIV, subindo da 7ª posição em 2021 para a 4ª no ranking nacional entre cidades com mais de 100 mil habitantes com maior índice da doença. Os dados são do Boletim Epidemiológico de HIV e Aids, divulgado pelo Ministério da Saúde em dezembro de 2024 (clique aqui para acessar o boletim na íntegra). A cidade do litoral paranaense fica atrás apenas de Canoas (RS), Porto Alegre (RS) e Camboriú (SC).
Além disso, Paranaguá lidera a incidência de HIV no Paraná, evidenciando a urgência de medidas mais eficazes para conter a epidemia. A taxa de detecção da doença na cidade subiu para 32,8 casos por 100 mil habitantes, enquanto a taxa de mortalidade chegou a 17,8 por 100 mil habitantes, um dos índices mais elevados do país. O aumento é perceptível quando comparado a 2021, quando a taxa de detecção era de 30,2 por 100 mil habitantes.
Outro dado preocupante revelado pelo Boletim Epidemiológico de HIV e Aids é o crescimento da taxa de detecção entre crianças menores de cinco anos, o que acende um alerta para a transmissão vertical do HIV – aquela que ocorre da mãe para o bebê durante a gestação, parto ou amamentação.
O que é o índice composto utilizado no ranking de HIV/Aids?
O índice composto utilizado pelo Ministério da Saúde para classificar os municípios com maior incidência de HIV/Aids no Brasil é um indicador que combina diferentes métricas para avaliar a situação da doença em cada cidade. Ele leva em conta a taxa média de detecção de Aids na população geral nos últimos três anos e sua variação nos últimos cinco anos, além da taxa de detecção em crianças menores de cinco anos no mesmo período. Também são analisadas a taxa média de mortalidade por Aids na população geral nos últimos três anos e sua variação ao longo dos últimos cinco anos. Outro fator incluído no cálculo é a função inversa da média do logaritmo da contagem inicial de CD4 das pessoas diagnosticadas desde 2009, um marcador importante que indica o estágio da infecção e a resposta imunológica dos pacientes.
Todos esses indicadores são padronizados matematicamente para permitir comparações entre os municípios. Esse método permite uma análise mais detalhada da epidemia de HIV/Aids, indo além do número absoluto de casos e observando a evolução da doença ao longo do tempo. Com isso, o índice composto se torna uma ferramenta fundamental para orientar políticas públicas, ajudando a identificar onde é necessário intensificar ações de prevenção, testagem e tratamento.
Por que Paranaguá tem um dos maiores índices do Brasil?
Para Leovaldo Bonfim, diretor da 1ª Regional de Saúde do Paraná, a posição de Paranaguá no ranking não é novidade. Ele destaca que há anos o município registra os maiores índices do estado e avalia que a situação pode estar relacionada a fatores como o intenso fluxo de pessoas que circulam na cidade, devido à atividade portuária, e o consumo elevado de drogas. “A população flutuante representa um desafio para a contenção da doença, pois muitas pessoas que passam pela cidade não mantêm um acompanhamento médico contínuo, dificultando o rastreamento e o tratamento da infecção”, disse à Ilha do Mel FM.
Além disso, Bonfim observa que a procura por testagem ainda é baixa, o que leva a muitos diagnósticos tardios. “Esse cenário preocupa, pois quanto mais tempo uma pessoa passa sem saber que tem HIV, maiores são os riscos de transmissão e de desenvolvimento de complicações associadas à aids”, afirmou.
Pastoral da Aids atua no apoio aos pacientes
Diante da alta incidência da doença na cidade, ações voluntárias desempenham um papel importante na assistência às pessoas que vivem com HIV e aids. Sueli Ferreira dos Santos, coordenadora da Pastoral da Aids do Santuário de Nossa Senhora do Rocio, relata que o trabalho da entidade busca orientar e apoiar pacientes e familiares, além de realizar campanhas de prevenção e combate ao preconceito.
Criada em 2005, a Pastoral atende cerca de 30 pessoas que vivem com a doença, oferecendo visitas domiciliares, apoio na compra de remédios e distribuição de cestas básicas para aqueles que enfrentam dificuldades financeiras. “Até 2007, a entidade chegou a contar com uma sede física para os atendimentos, mas, com a redução de doações ao longo dos anos, o espaço precisou ser fechado, tornando o trabalho voluntário ainda mais desafiador”, disse à Ilha do Mel FM.
Além do atendimento direto, que acontece às quintas-feiras, das 14h às 17h no Santuário do Rocio, a Pastoral participa de ações em datas específicas, como a Vigília e Mobilização em Solidariedade às Vítimas da Aids, realizada anualmente em maio, e o Dia Mundial de Combate à Aids, em 1º de dezembro. Fora desse período, o atendimento ocorre de forma remota, por meio do WhatsApp (41 99984-2538), onde os voluntários oferecem informações e suporte às pessoas recém-diagnosticadas.
“Normalmente, as pessoas nos procuram quando recebem um exame com resultado positivo. A partir desse momento, começamos a oferecer apoio, ajudando com informações sobre o tratamento e, em alguns casos, auxiliando com medicamentos ou cestas básicas“, explica Sueli.
Casos de HIV no Litoral passam de 640
O Litoral do Paraná registra um aumento progressivo nos casos de HIV, totalizando 642 novas infecções entre 2020 e janeiro de 2025, de acordo com a 1ª Regional de Saúde de Paranaguá.
Paranaguá se destaca como o município mais afetado, com 340 novos casos no período, o que representa mais da metade das infecções registradas no Litoral. O número de diagnósticos no município tem crescido nos últimos anos, passando de 57 em 2020 para 85 em 2024.
Além de Paranaguá, Guaratuba aparece como o segundo município com mais casos confirmados, com 109 registros desde 2020. Em seguida, estão Matinhos (79 casos), Pontal do Paraná (62 casos), Antonina (26 casos), Morretes (14) e Guaraqueçaba (2).
Apenas em janeiro de 2025, foram registrados 10 novos casos de HIV na região, sendo seis em Paranaguá, dois em Guaratuba, um em Matinhos e um em Morretes.
Óbitos por Aids também preocupam
Além do aumento dos casos, a mortalidade por Aids no Litoral do Paraná também acendeu um alerta, com 40 óbitos registrados entre 2020 e 2024. Novamente, Paranaguá lidera as estatísticas, com 24 mortes no período.
Matinhos, que não registrava óbitos até 2022, apresentou um crescimento preocupante, contabilizando sete mortes entre 2023 e 2024. Guaratuba teve quatro óbitos, enquanto Pontal do Paraná registrou dois e Morretes, dois. Antonina confirmou um único óbito no período analisado.
Brasil e o desafio de eliminar a aids até 2030
O Brasil é signatário da Estratégia Global da Organização Mundial da Saúde (OMS) para eliminar a aids como problema de saúde pública até 2030. Para atingir esse objetivo, o país precisa:
- Diagnosticar 95% das pessoas vivendo com HIV;
- Tratar 95% das pessoas diagnosticadas;
- Garantir que 95% dessas estejam com a carga viral suprimida, reduzindo a transmissão.
Além dessas metas, o Governo Federal pretende reduzir a taxa de incidência e o número de óbitos por aids em 90% até 2030.