Por Luiza Rampelotti
Com 634 novos casos de tuberculose registrados entre 2019 e 2025, Paranaguá é o município com maior incidência da doença no Litoral do Paraná e um dos mais afetados do estado. Apenas em 2024, foram notificados 106 casos na cidade, representando mais da metade dos 188 registros feitos na 1ª Regional de Saúde, que abrange os sete municípios da região. Os números refletem uma taxa alarmante: 70,7 casos por 100 mil habitantes, enquanto a média estadual é de 20,4.
Diante desse cenário preocupante, o Ministério Público do Paraná (MPPR) emitiu uma recomendação administrativa ao prefeito Adriano Ramos (Republicanos) e à secretária municipal de Saúde, Patricia Scacalossi, cobrando providências imediatas para conter a disseminação da doença. Entre as medidas sugeridas pelo órgão, estão a ampliação da vacinação, o fortalecimento do diagnóstico precoce, a triagem ativa de sintomáticos respiratórios e a garantia de fornecimento contínuo de medicamentos para os pacientes.
A recomendação do MPPR leva em conta não apenas a alta incidência de tuberculose, mas também a baixa cobertura vacinal do município. Embora o Paraná tenha atingido uma taxa de vacinação de BCG de 90,08% em 2022, Paranaguá registrou apenas 73% de cobertura em 2024, o que pode aumentar os riscos de contágio e dificultar o controle da doença. O Ministério Público deu um prazo de 20 dias para que a Prefeitura informe as ações que serão tomadas para acatar as recomendações.
Perfil dos casos e principais desafios
Um levantamento realizado pela Ilha do Mel FM, com base em dados da 1ª Regional de Saúde, detalha a evolução dos casos de tuberculose na região. Em Paranaguá, o número de casos novos teve variações ao longo dos anos: 114 em 2019, 77 em 2020, 110 em 2021, 118 em 2022, 105 em 2023 e 106 em 2024, com um total acumulado de 634 casos. Em 2025 foram registrados 4 casos da doença.
Os dados de 2024 revelam um perfil dos pacientes diagnosticados em Paranaguá: a doença afeta diversas faixas etárias, com uma concentração maior entre adultos de 30 a 59 anos, com 20 casos na faixa de 30 a 39 anos e 21 casos na faixa de 40 a 49 anos. Além disso, há uma incidência considerável em pessoas com mais de 60 anos, com 27 casos entre 60 e 69 anos e 9 casos entre 70 e 79 anos. Entre os mais jovens, foram registrados 4 casos em menores de um ano e 5 casos na faixa etária de 15 a 19 anos.
Causas
Em entrevista à Ilha do Mel FM, a secretária de Saúde de Paranaguá, Patricia Scacalossi, afirmou que o município enfrenta dificuldades estruturais e epidemiológicas no combate à doença. Segundo ela, fatores como o clima, a vulnerabilidade social, a movimentação intensa no porto e os altos índices de HIV contribuem para a persistência da tuberculose na cidade.
“A adesão da população ao tratamento é de extrema importância. Paranaguá é considerada uma cidade endêmica para a tuberculose, e só conseguiremos reduzir a contaminação se os pacientes diagnosticados seguirem corretamente o tratamento até a cura”, destacou Scacalossi.
Segundo ela, apesar do elevado número de casos, a média de novos diagnósticos tem se mantido estável ao longo dos anos, com cerca de 10 notificações mensais. A secretária ainda destacou que todos os pacientes identificados estão recebendo acompanhamento médico e tratamento gratuito pela rede pública.
Vacinação e falhas no sistema de informações
Patrícia Scacalossi também afirmou que a cobertura vacinal em Paranaguá pode estar subnotificada devido a um erro no sistema que transmite os dados ao Ministério da Saúde. Ela ainda garantiu que o município vacina um número significativo de recém-nascidos, mas que inconsistências nos registros podem ter levado a um índice oficial inferior ao real. “Paranaguá vacina bastante. O que ocorreu foi um erro no sistema de informação que transmite os dados ao Ministério da Saúde. Isso foi detectado na gestão anterior e continuamos corrigindo para que os números reflitam a realidade”, afirmou.
Segundo a secretária, todos os bebês nascidos no Hospital Regional do Litoral já recebem a vacina BCG ao nascer, uma iniciativa criada em parceria com o Governo do Estado. A medida visa garantir que a imunização ocorra antes da alta hospitalar, evitando atrasos na vacinação infantil.
De acordo com Patrícia, entre 2010 e 2016 Paranaguá foi considerada um exemplo nacional em diagnóstico e tratamento da doença. No entanto, a pandemia de Covid-19 trouxe impactos negativos para o controle da tuberculose.
“Muitas ações foram deixadas de lado devido à emergência da pandemia, o que levou a um aumento dos casos nos últimos anos. Mas a gestão do prefeito Adriano Ramos, que assumiu há pouco mais de dois meses, já detectou essas falhas e está retomando as campanhas de conscientização sobre a tuberculose”, explicou a secretária.
Ações para reforçar o combate à doença
Atualmente, a rede municipal de saúde está focada em fortalecer a identificação precoce dos casos, ampliando o acesso a exames como o Teste Rápido Molecular, baciloscopia e PPD, além de radiografias e consultas multidisciplinares para acompanhamento dos pacientes. Sobre as medidas preventivas, a secretária confirmou que a Secretaria de Saúde pretende intensificar campanhas de conscientização e mobilizações para o controle da doença, buscando aumentar a cobertura vacinal e reduzir a transmissão.
“Paranaguá é considerada uma cidade endêmica para a tuberculose, o município já chegou a tratar simultaneamente 120 pacientes. Só conseguiremos reduzir a contaminação se os pacientes diagnosticados seguirem corretamente o tratamento até a cura. Toda a população com sintoma de tosse, sudorese noturna, cansaço e emagrecimento deve procurar imediatamente a UBS e fazer o exame de escarro”, ressaltou Scacalossi.
A secretária de Saúde anunciou que, no Dia Mundial da Tuberculose, em 24 de março, as Unidades Básicas de Saúde (UBS) intensificarão a busca ativa por sintomáticos respiratórios. O objetivo é identificar pacientes que apresentam tosse persistente há mais de uma semana e encaminhá-los para exames de escarro, garantindo diagnósticos mais rápidos e precisos.
Além disso, a equipe municipal de Epidemiologia e Tuberculose está reforçando estratégias para melhorar o acompanhamento dos pacientes e aumentar a adesão ao tratamento, que dura seis meses na forma padrão e pode se estender por até um ano nos casos resistentes.
Diagnóstico precoce e desafios no tratamento
A enfermeira do Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA), Suellen Lacerda, reforça a importância do diagnóstico precoce e da adesão ao tratamento. “É importante que a pessoa que notar algum sintoma, procure a unidade básica de saúde mais próxima para realizar o exame”, explica.
O CTA, localizado no Centro de Diagnóstico João Paulo II, oferece atendimento sem necessidade de agendamento e atua na busca ativa de casos suspeitos. Além disso, a equipe de saúde fornece cuidados domiciliares e tratamentos supervisionados para garantir que os pacientes sigam o protocolo correto.
Um dos principais desafios no combate à tuberculose é a adesão ao tratamento, que dura seis meses na forma padrão e pode se estender por até 12 meses em casos de tuberculose multirresistente. “Não são altos os números de pessoas que evitam o procedimento, mas nosso intuito é que todos os pacientes confirmados completem o tratamento”, salienta Suellen Lacerda.

A transmissão da doença diminui significativamente entre 15 e 30 dias após o início da medicação, reforçando a importância de que os pacientes sigam corretamente todas as etapas do tratamento. Para garantir essa adesão, a equipe de saúde adota o modelo de Tratamento Diretamente Observado (DOT), no qual os profissionais acompanham de perto a administração dos medicamentos e realizam visitas domiciliares com o suporte de agentes comunitários de saúde.
Medidas recomendadas e próximas ações
Entre as principais recomendações do MPPR para conter a tuberculose em Paranaguá, estão:
- Ampliação da vacinação contra a tuberculose, com campanhas voltadas para recém-nascidos e crianças menores de cinco anos, além da extensão do horário de funcionamento das Unidades Básicas de Saúde (UBS);
- Estratégias de vacinação domiciliar para famílias em áreas de difícil acesso, como as Comunidades Marítimas de Paranaguá;
- Triagem ativa de pacientes sintomáticos nas unidades de saúde, com identificação rápida de casos suspeitos;
- Maior agilidade nos exames laboratoriais, com resultados emitidos em até 48 horas para diagnóstico precoce;
- Monitoramento contínuo dos pacientes diagnosticados, garantindo acompanhamento e adesão ao tratamento;
- Fornecimento gratuito e contínuo de medicamentos para evitar a interrupção do tratamento e o desenvolvimento de formas resistentes da doença;
- Campanhas de conscientização sobre os sintomas, as formas de transmissão e a importância do tratamento adequado.